Da ruína

Todas as manhãs era o mesmo não saber.
Ela não sabia quem era aquela pessoa frente ao espelho. Lavou o rosto, fixou os olhos com atenção no reflexo, e mesmo assim enxergava apenas uma imagem embaçada. Sem contornos definidos, sem um sorriso estampado no rosto, sem brilho nos olhos, sem nada que vibrasse dentro do peito: nem desassossego, nem paixão.


Aquilo a perturbava, era uma ausência de si mesmo que feria a alma. Se é que ainda existia alma. O vazio havia se alastrado tanto, que ela já não sabia onde começava e muito menos onde terminava aquele denso abismo. E como pesa o vazio! Irônico não?
Nada a movia. Nem fé, nem esperança. Nem planos descabidos, nem mesmo sua fértil imaginação a salvava nesses dias. Deixou de lado a caixa de lápis de cor, afinal já não fazia mais diferença pintar um sol (de óculos escuros, sorrindo) no canto do dia.
Havia perdido o apetite pela vida, logo ela que devorava com gosto a rotina dos dias. Deixou cair pelo caminho a disposição, o foco, a vontade, a essência. Ela, havia se perdido. Quando? Onde? Por quê? Não sabia. E esse não saber, era a sua ruína.

Pra complementar o desabafo, um trecho escrito por Ana Jacomo. (so true) :

"É fácil amar o outro na mesa de bar, quando o papo é leve, o riso é farto, e o chopp é gelado. É fácil amar o outro nas férias de verão, no churrasco de domingo, nas festas agendadas no calendário do de vez em quando.
Difícil é amar quando o outro desaba. Quando não acredita em mais nada. E entende tudo errado. E paralisa. E se vitimiza. E perde o charme. O prazo. A identida...de. A coerência. O rebolado. Difícil amar quando o outro fica cada vez mais diferente do que habitualmente ele se mostra ou mais parecido com alguém que não aceitamos que ele esteja. Difícil é permanecer ao seu lado quando parece que todos já foram embora. Quando as cortinas se abrem e ele não vê mais ninguém na platéia. Quando o seu pedido de ajuda, verbalizado ou não, exige que a gente saia do nosso egoísmo, do nosso sossego, da nossa rigidez, do nosso faz-de-conta, para caminhar humanamente ao seu encontro.Difícil é amar quem não está se amando.

Mas esse talvez seja, sim, o tempo em que o outro mais precisa se sentir amado. Eu não acredito na existência de botões, alavancas, recursos afins, que façam as dores mais abissais desaparecerem, nos tempos mais devastadores, por pura mágica. Mas eu acredito na fé, na vontade essencial de transformação, no gesto aliado à vontade, e, especialmente, no amor que recebemos, nas temporadas difíceis, de quem não desiste da gente."

ps: **Que estejamos cercados de gente que não desiste da gente em 2012, e se não for pedir demais, que a gente nunca desista de nós mesmos...

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