Lembranças

Sempre que me pego escutando as músicas do finado Cenair Maicá, lembro dos dias de domingo em que a gente acordava mais cedo e já ia ajeitando os espetos, o fogo e a erva para o chimarrão.

Desde guria, lembro de acordar ao som de "Balseiros do Rio Uruguai", era o velho Maicá que cedito já cantarolava a tradição missioneira pelos quatro cantos da casa. Enquanto isso, minha mãe preparava uma maionese caseira bem caprichada, e eu que sempre me diverti na cozinha, temperava com gosto um peça de costela bem gorda, escolhida a dedo pelo meu pai.

O mate amargo já passeava de mão em mão, um chimarrão bem feito - companheirito de longas conversas e boas risadas. E da churrasqueira velha e engraxada, crescia um fogo que de longe ardia, arte do meu irmão mais velho, que entre um trago e outro, de relancina cuidava faceiro o braseiro. No meio do pátio, minha vó armava o carteado, e entre uma jogada e outra, a canastra limpa se fazia. E ai de quem discordasse da velha, afinal coringão limpava canastra. (rs)

E era no meio daquele entrevero, embaixo daquela sombra de mangueiral que eu e o meu pai, arriscava um vanerão desajeitado ao som de Km 11, do próprio Maicá.

Certa vez, achei uma foto antiga do cantor missioneiro, perdida entre as fotos da família, e atrás uma dedicatória para o velho. Então minha mãe me contou dos bailes e farras que ele e meu pai faziam. Não recusavam um bom fandango regado a muita cachaça. (rs)

E eu mal sabia, dos planos incertos do destino quando escrevi para o meu pai, em um pedaço de papel amassado, o trecho de sua música favorita:
"Se meu destino é cantar, eu canto, meu mundo é mais que chorar, não choro. A vida é mais do que pranto, é um sonho..." (Cenair Maicá - Canto dos Livres).
E essa foi a ultima vez, que vi meu velho sorrir com os olhos. (=/)

Depois disso se passou muito tempo, e esses dias atrás, enquanto dirigia rumo ao serviço, me peguei escutando o velho Maicá, que como de costume cantava suavemente a liberdade.

Das músicas e fatos, refrões e sentimentos, fica a eterna admiração ao cantor que com talento, fez de seus versos e poesia, as minhas mais preciosas lembranças.

"Por saber tudo o que sei me sinto bem a vontade
Sempre pronto a defender guerra, honra e liberdade"
(Cenair Maicá - 1947-1989)

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